
BRASÍLIA (Reuters) – A Câmara dos Deputados aprovou ontem à noite o Projeto de Lei nº 1676/20, que proíbe a importação de estrangeirismos por parte de coaches em território nacional. Segundo o relator do PL, deputado Nuno Álvares de Bragança (MDB-SP), isso não afeta termos consagrados antes do advento do coaching no país, mas vale para todos os demais produtos do mercado estrangeiro que possam ser substituídos por formas correspondentes que já existam em português.
O deputado Enzo Jones (Podemos-MG) foi um dos que votaram contra o projeto. Ele era head de coaching e mentoring de startup antes de exercer seu mandato e considera a medida uma ação impensada: “O estrangeirismo é um dos quatro pilares do coaching. Os termos usados por coaches podem ser mais precisos e específicos nos contextos em que são usados, e às vezes não podem ser adequadamente substituídos. Faltou background e design thinking pra lidar com esse assunto. Com um mindset desses, o país precisa de reset”, disse o parlamentar mineiro, cuja esposa é headhunter e ministra workshops de mentorship destiny.
Apesar de reconhecer a funcionalidade de certos anglicismos, a maioria na Câmara justifica a necessidade de reprimir abusos: “Isso não tem a ver com pureza linguística, e sim com a absoluta falta de necessidade de muitos desses empregos. Existem, sim, vários estrangeirismos bem-vindos por não contarem com palavras correspondentes adequadas ao seu sentido original. Mas que dificuldade esses coaches têm de agendar em vez de ‘schedular’? Por que não fazem reunião em vez de meeting? Precisam fazer call quando basta uma ligação? Usar quiet quitting só pra se referir a demissão silenciosa? Daqui a pouco todo mundo vai começar a chamar assédio moral de quiet firing! Se é pra usar outra língua que não seja o Português, que seja alguma do tronco Tupi-Guarani então. Talvez o Policarpo Quaresma de Lima Barreto tivesse alguma razão”, disse a deputada Tainá Kauane (Rede-AC).
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Embora pareça ter como alvo o meio corporativo, a medida visa combater a importação desenfreada em diversas outras vertentes do coaching em que o abuso se disseminou, como coaching de vida, coaching teológico e coaching quântico. “Outro dia eu estava ouvindo um podcast de psicólogos coaches e fiquei chocada com o tanto de setting, camping e reset que eram pronunciados a cada minuto. Parecia aula de inglês instrumental”, disse uma estudante do terceiro semestre de Psicologia que prefere preservar sua identidade.“Nada contra estrangeirismos, mas ficar chamando paciente, cliente ou aluno de coachee já é muita forçação de barra”, disse Raoni Piragibe, que decidiu trocar seu coach anglicista por um terapeuta purista.
Até o meio evangélico se tornou alvo dessa prática: “Parei de frequentar uma igreja justamente por causa da teologia coach e do empreendedorismo de púlpito. Com a importação da estilística coaching, a casa de Deus foi tomada por worship, influchurch, mentorship destiny e outros anglicismos que parecem mais uma perversão do dom de falar em línguas estranhas”, declarou João Batista, ex-frequentador da International Ministry of Worship.
A recém-criada Comissão de Lexicologia e Lexicografia da Câmara informou que ainda não foi definido como serão realizadas a fiscalização e a aplicação de penalidades relacionadas aos termos vedados. “Vários cases estão sendo inputados [sic] para análise. É preciso planejar um approach. No momento faltam insights e team bulding, mas faremos invite pra survey com follow-up”, informou por e-mail o deputado Arnaldo Brunet (PTB-RJ), presidente da comissão.
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