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(P)referências bibliográficas (II): Diccionario de João Fernandes (1878)

Atualizado: 24 de mar.


Apesar do subtítulo pomposo, o Diccionario de João Fernandes: lições de lingua portugueza pelos processos novos ao alcance de todas as classes de Portugal e Brazil (1878) não tem nada de lexicográfico: é puro sarcasmo do poeta, dramaturgo e romancista português Francisco Gomes de Amorim (1827–1891), inspirado na zombaria de Le Carnaval du Dictionnaire (1874), de Pierre Véron. Certos "verbetes" são praticamente adaptações em português daqueles existentes na obra francesa, tanto que, ao final do prefácio, o autor assume que "os artigos desengraçados ou obscuros não são meus. Traduzi-os do francês. Eu só fiz os que teem graça".


Amorim tinha a intenção de usar o título "Dicionário de pimenta na lingua", mas depois preferiu nomeá-lo apenas com seu pseudônimo, João Fernandes, provavelmente porque nele alfineta ou esculhamba, de forma generalizada, escritores, poetas, políticos, religiosos, policiais e membros diversos da sociedade com verbetes que soam às vezes poéticos e reflexivos e outras vezes só debochados mesmo:


CANALHA – Tomado á franceza, é gallicismo; porém a abundancia de genero nacionalizou-o.


ERUDITO – Ente que resuscita mortos.


FRANCEZA (lingua) – O portuguez de muitos literatinhos nossos.


GRAMMATICA – Inutilidade que atrapalha e embaraça varios sabios de meia tijela.


ILLUSÃO – Vacca de muitas mil tetas, onde todos mamam sem dar por isso.


JUSTIÇA – Um mytho para os pobres, e modo dos ricos fazerem do torto direito.


LINGUA – A arma de maior alcance.


NACIONALISAR – Em linguagem de vários litteratos, é abastardar peças francezas com portuguez mascavado.


OCIO – Deleite que os pobres compram caro.


PACIÊNCIA – Virtude que ninguém se esquece de aconselhar áquelles a quem pisa os callos.


PATIFE – Homem de bem que se descuida.


PATRIOTA – Homem que quer mamar.


PERDÃO – Applauso que pede 'bis' ao patifes.


POEMA – Caldeirada de versos. Eu prefiro as de enguia.


POLÍCIA – Um mytho.


PONTUAÇÃO – Os alfinetes de pregar a palavra escripta.


PORTUGUEZ – Lingua que todos falam e ninguém sabe.


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A quem interessar possa, é possível baixar a versão digitalizada da obra original (1878) aqui. Pra quem é de Kindle, a obra está disponível gratuitamente em edição digitalizada aqui.

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